Resenha ▪︎ "A Perversão Social: Abordagens Atuais". Série Estudos em Saúde Coletiva n° 134 UERJ, 1996. Carlos Augusto Peixoto Júnior.
Psicanalista, Doutorado em Saúde Coletiva.
Trata-se de um artigo que visa estabelecer um panorama geral das principais leituras promovidas pela teoria psicanalítica contemporânea quanto ao tema da perversão social.
Esta perspectiva de análise pretende tornar possível a obtenção de uma compreensão sobre fenômenos político-sociais de massa, tais como o racismo, o totalitarismo e o nazismo, proporcionando uma visão de suas consequências na sociedade.
O tema da perversão sempre foi motivo de polêmica na psicanálise, desde Freud.
No decorrer da história da psicanálise, tornou-se fácil encontrar nas diferentes vertentes psicanalíticas, desde as mais ortodoxas até as mais avançadas, posturas mais ou menos moralistas sobre o assunto.
Para Freud, a perversão se dá sempre no nível do gozo e, neste sentido, pouco importa a parte do corpo que seja acionada para obtê-lo.
O que marca de maneira mais definitiva a normalidade, a perversão ou a neurose só pode ser compreendido no nível das relações entre o ego e suas identificações, que permitirão ou não o gozo.
Existem formas ocultas de perversão social em que o véu que recobre o falo ao transformado em fetiche pode adquirir a forma da massa ou do grupo; os exemplos do nazismo ou do fascismo são suficientes para comprovar esta tese.
Embora tal tipo de perversão seja mais frequente do que se imagina, muitas vezes pode ser difícil identificá-la em função do colapso que ela ocasiona na própria estrutura das relações sociais.
Por esta razão principal, entre outras, não são poucos os momentos em que os sujeitos acreditam que suas verdades e as dos outros não posssam se revelar de uma forma mais plena senão através de um esquema perverso - que em casos como estes parece surgir como uma saída para a neurose individual.
Daí pode-se deduzir a necessidade que o perverso tem de exibir periodicamente o falo através da palavra - às multidões das quais ele suscita a adoração - enquanto instrumento de poder.
Esta exibição periódica constitui uma tentativa constante de fazer funcionar um sistema sem falhas. Aqui operam internamente a instrumentalização e a degradação do outro que se torna um objeto idealmente inanimado e manipulável pela perversão.
A perversão social é pensada como uma tentativa de resposta à inevitável incompletude do universo simbólico.
O perverso entraria na vida do grupo através da porta aberta pela causa do desejo neurótico, em função da qual ele exige seu fetiche, e por isso goza onde o neurótico deseja. Como a causa do desejo só funciona enquanto tal na medida em que o gozo seja interditado, torna-se suficiente, para obtê-lo, detectar as interdições e transgredi-las.
Por esta razão, muitas vezes o perverso vive o social através de frequentes e inesperadas invenções da figura do legislador, chegando inclusive a fazer, o permitido como se fosse proibido para "burlar" a lei. Com certa frequência ele aparece na situação social inserido numa burocracia da qual extrai seu gozo.
O perverso tira proveito deste tipo de circunstâncias encontrando prazer em se apagar do que se imagina ser o interesse geral do "outro", constituído num grupo, partido ou Estado. Para que o burocrata goze, parece suficiente que para todos e para cada um, o grupo, o partido, etc., funciona como "outro".
Nestas condições passa a operar uma homogeneização, um igualitarismo do gozo, onde a figura do chefe, eleito em função de suas aptidões e na medida de sua falta de ambição, acaba por estabelecer um terrível deserto intersubjetivo onde só goza o aparato, que não é encarnado por ninguém em particular. Todos se submetem, todos se anulam e todos gozam.
O autor Carlos Augusto Peixoto Júnior utiliza neste artigo o método dedutivo, recorrendo aos procedimentos analíticos e interpretativos fornecidos pela teoria psicanalítica contemporânea, procedimento este Histórico e Estruturalista.
🌼 Jane Freitas Ribeiro